quinta-feira, 26 de maio de 2011

SUSSURROS DA NOITE


Gosto de ouvir a voz da noite cochichando em meus ouvidos. Ela é sábia, percebe, compreende e diz exatamente aquilo que preciso ouvir.
No atropelo do dia a dia os ruídos rotineiros e a ânsia de viver cada instante, entorpecem os pensamentos mais reflexivos e a conversa comigo fica para depois.
Quando a madrugada se instala e as vozes do mundo aquietam, aí sim consigo ouvir a fala da noite, ainda que entrecortada por um ou outro barulho que teima em não se calar.
De olhos fechados e no escuro do quarto, vou identificando cada som que grita lá fora: carros circulando, murmúrios do mar brincando de vai e vem na areia, latido solitário de um cão, sirene ao longe que traz sobressaltos e lembranças de um passado recente.
Ah! E quando chove bem mansinho, então?!  Essa conversa fica ainda mais agradável ritmada pelo barulhinho da chuva escorrendo nos vidros da janela do quarto.  Como já disse o poeta: “Gotas de água que em minha janela caiam, cantaram sua líquida melodia."*
A chuva canta baixinho enquanto a noite se põe a falar.
Começa num sussurro, cochichando mesmo, para que ninguém mais possa ouvir. Relembra os fatos recentes e logo parte para expectativas do dia que aguarda para nascer.
Espantoso como as ideias fervilham na mente nesses momentos! Já nem sei mais de quem é a voz que me fala. Um pensamento atropela o outro misturando assuntos e muitas vezes mostrando novos ângulos de situações que ainda não havia observado. A confusão de ideias que a princípio parece um caos logo toma sentido e no escuro da noite luzes iluminam soluções.
Outras vezes em meio a esse burburinho, a memória é revolvida e as histórias são recontadas e reinventadas na busca por finais felizes.  Nesses momentos realidade e sonhos se misturam ouvindo a voz que acalma o espírito falando com seu silêncio.
Pensamentos e ideias chegam aos ouvidos de maneira tão intensa que me forçam a levantar e transformar os sussurros em palavras soltas numa folha branca de papel.
No escuro da noite a alma se mostra clara e liberta, sem pudores, sem receios.  Desejos e sonhos pulam da mente para o papel num jogo mágico de letras que se combinam e se completam.
Como num jogo vou deslocando palavras, ora avançando, ora recuando casas, numa ansiedade tal que nem percebo quando a noite começa a se calar e seu sussurro dá lugar às vozes que acompanham o dia prestes a nascer.
Na superfície branca do papel, palavras concluem mais uma história anunciando final de jogo e final de noite.

Santos, 21 de maio de 2011

* CHOVEU - Ricardo.Rossi

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