sábado, 29 de junho de 2013

UMA UNIVERSIDADE CHAMADA VIDA




O aprendizado é o resultado de nossos estudos aliados à experiência de vida; na verdade é essa experiência que nos conduz a comportamentos bem mais adequados do que qualquer estudo por mais profundo que seja.
Interessante que só nos damos conta disso quando nossa bagagem de anos já pesa razoavelmente.
Pensando sobre isso, me veio à mente um fato ocorrido logo no início da carreira profissional envolvendo um aluno residente na zona rural. Estudava no período noturno, pois ajudava a família na lavoura, apesar dos seus 13 anos somente.
Não era uma mente brilhante, mas suas maiores dificuldades provinham justamente da falta de tempo para se dedicar aos estudos. 
O aluno já havia ficado retido para os exames de segunda época (ainda não havia o processo de recuperação) em duas disciplinas; com a reprovação  nos exames finais também em Ciências, completou a terceira disciplina, fato este que o levou à reprovação na 6ª série do Ensino Fundamental.
Até hoje me lembro do erro que cometeu na última questão da prova e que lhe resultou em uma nota abaixo da média.   Ele não soube explicar o que eram pés acolimbéticos encontrados em algumas aves.
Na realidade o aluno errou também outras questões básicas e importantes, mas esta última foi a que encerrou sua chance de aprovação.
Recém-formada, trazia na bagagem muitas informações adquiridas na faculdade, mas todo esse aprendizado não teve sua aplicação de maneira adequada justamente por causa da inexperiência de vida.
Com certeza essa minha memória para o fato está associada ao arrependimento que veio posteriormente.  Hoje me pergunto o que pretendia avaliar ao formular tal questão?  Talvez pela falta de experiência, pus em prática a expressão ser mais realista que o rei.
É a velha história de que não basta saber O QUE avaliar, mas COMO avaliar, tema este que já foi abordado no texto ENTENDERAM? publicado neste mesmo blog.
Se encontrasse este aluno novamente, depois de transcorridos quase 40 anos, iria lhe perguntar se o fato de desconhecer o que eram pés acolimbéticos lhe trouxe algum prejuízo na vida, além de fazê-lo perder um ano de estudos.
Provavelmente na ocasião, sentia-me a dona da verdade.  Hoje, já com anos e anos de estrada nesta vida, sei que ninguém é senhor absoluto de verdade alguma.
Realmente a vida é uma grande Universidade.
A propósito, você sabe o que são pés acolimbéticos? 
Não????
Como você conseguiu viver até hoje sem saber isso?????

Santos, 16 de junho de 2013 


Nesta homenagem a um ex-aluno, faço aqui um mea culpa.

sábado, 22 de junho de 2013

NOVA ESPÉCIE DE PEIXE


Pesquisando em sites de livrarias deparei-me com o título “Odeio Reuniões”.
De imediato ouvi-me dizendo – eu também!
Na vida profissional participei de muitas delas. Posso afirmar com certeza que somente em torno de 25% foram bem proveitosas e úteis.  Uma boa parcela foi pura perda de tempo, ou como se costuma dizer, foi como “chover no molhado”.
Recordo-me que sempre havia alguém que se destacava por fazer apartes totalmente desnecessários e fora de contexto.  A pessoa falava, falava, interrompia a sequência da reunião, fugia da pauta e nada se aproveitava.
Quando ocorriam tais situações, um pequeno grupo de colegas que geralmente sentava-se no fundão da sala, brincava entre si identificando tal pessoa com o apelido de ignorante desinibido.  Isto porque ela não se dava conta dos despropósitos que falava e ainda ficava “se achando”, como diz a moçada de hoje.
Foi justamente um destes ignorantes desinibidos o causador de um constrangimento que este grupo do fundão, passou durante uma reunião de diretores.
A pauta desenvolvida tratava sobre a necessidade de melhoria na merenda escolar. 
Várias sugestões foram dadas até que alguém resolveu fazer um verdadeiro discurso sobre os benefícios da carne de peixe, propondo que ela constasse do cardápio diário das escolas. Para viabilizar isso, sugeriu que fossem criados peixes num famoso lago da cidade, sabidamente muito poluído por esgotos clandestinos. 
Enquanto o desinibido defendia sua proposta com toda ênfase, um diretor que fazia parte do grupo do fundão da sala resolveu apoiar essa ideia.   Falando em tom baixo para que somente quem estivesse bem próximo o ouvisse, comentou que já havia muitos peixes vivendo no tal lago.
Diante da surpresa dos colegas, forneceu-lhes mais detalhes.
Aproximou as mãos abertas uma da outra e deixando entre ambas um espaço de uns 15 cm, explicou que esse era o tamanho médio dos peixes e que os mesmos tinham escamas na cor marrom.
Quando lhe perguntaram qual era o nome do peixe, ele esclareceu que se tratava de uma espécie de origem japonesa cujo nome era Torossô.
A gargalhada foi inevitável e a reunião imediatamente interrompida.
Todos os olhares foram dirigidos ao fundão da sala.
O dirigente que presidia a reunião quis saber o motivo de tanta alegria, mas obviamente não obteve resposta.  Ninguém quis se atrever a falar o nome do peixe que já povoava o lago.
Sobrou-lhes então uma chamada de atenção que só não foi mais severa porque tal dirigente sabia que esse grupo era formado por pessoas que apesar de brincalhonas, eram realmente comprometidas com a profissão e muito competentes.
Depois dessa interrupção, o assunto da pescaria no lago foi abortado por motivos óbvios e os tais peixes japoneses ficaram a salvo dos perigosos anzóis. 
Creio que até hoje vivam felizes nadando naquele lugar que ironicamente se chama Lago Azul.


Santos, 16 de junho de 2013

Uma homenagem aos diretores do fundão que alegravam nossas reuniões e em especial ao Kasuo.

sexta-feira, 14 de junho de 2013

EM CLARO, NO ESCURO




2:10
Esses são os números que vejo no relógio digital ao lado da cama.
Não é comum, mas vez ou outra, a insônia resolve me fazer companhia madrugada afora.  Hoje ela está aqui, firme e forte.  Tudo indica que passarei boa parte da noite, em claro.
Na verdade de uns tempos para cá, mesmo enquanto durmo, meu quarto passa as noites praticamente às claras.  São tantas as luzinhas acesas em aparelhos como modem, roteador e TV, que a escuridão deixou de ser absoluta.
A insônia surge quando a rotina do dia é quebrada por alguma emoção especial ou existe uma ansiedade por algo que está por vir.
O barulho incessante de carros na avenida me deixa intrigada.  Para onde é que toda essa gente tem que ir às 2 horas da madrugada e no meio da semana!!??
Geralmente desisto de medir forças com a insônia e pego um livro na cabeceira da cama.  Hoje, entretanto, a concentração está difícil e desisto de ler.
Lembro-me que certa manhã logo ao levantar, comentei com minha mãe que meus olhos pareciam secos durante a noite e que com isso não havia conseguido dormir direito.   Ela bem objetiva como sempre, soltou a resposta imediata:
-Levantasse e molhasse os olhos!  Simples assim! Fácil, não é?
Para ela sono não era problema. Na verdade tinha sono até demais.
Costumava lançar mão de estratégias para dormir um pouco após o almoço e para isso, convidava o neto ainda pequeno, para “descansar o corpinho”, que era como ela costumava falar. 
Na verdade ele queria mais era brincar e mesmo já deitado com a avó, seus olhos ficavam espiando e procurando motivos para pular da cama.
Certa vez ela consumida pelo cansaço e vendo que o garoto não fechava os olhos, resolveu dar rápidos e pequenos sopros em seu rosto.
Para evitar o ventinho que o incomodava, o menino abaixava as pálpebras para logo em seguida, levantá-las novamente.  Em pouco tempo, acabou desistindo de manter os olhos abertos e realmente dormiu.   Ela havia descoberto uma nova estratégia para fazê-lo dormir e também poder cochilar um pouco à tarde.
4:00 cravados no relógio ao lado de minha cama.
Pelo jeito minha insônia se prolongará até o dia amanhecer.
Ah, como seria bom, muito bom mesmo, se eu pudesse contar agora, com a ajuda de uns soprinhos maternos que me fizessem dormir e descansar o corpinho!!!

Santos 14 de junho de 2013

domingo, 9 de junho de 2013

"QUANTO TEMPO DURA O ETERNO?"



Ah, o tempo! Sempre cronometrando nossas vidas.
Interessante como o conceito de tempo muda à medida que os anos se acumulam em nossa estrada.  Conforme a etapa de nossas vidas o consideramos lento ou rápido demais.
Na infância pouco nos importamos com ele.  Na verdade até o ignoramos. Vivemos cada dia a seu tempo, sem preocupações com futuros ou com passados.  O que nos interessa é o hoje, o presente, no qual depositamos nossas esperanças, satisfações, tristezas.
A entrada na adolescência e juventude que a segue provocam uma reviravolta em todos os sentidos. Buscamos algo que nem sabemos exatamente o que seja, mas o queremos com toda firmeza. Nesse período tão conturbado física e psicologicamente, temos a impressão que o tempo se arrasta vagarosamente, dia após dia, semana após semana.  Do alto (ao menos é assim que nos sentimos) dos 15 anos, queremos que ele passe depressa pois temos urgência de vida.
Nossos olhos já não focam somente o hoje, mas estão voltados principalmente para o futuro e aí é que o tempo parece querer frear nossos anseios. Buscamos a maioridade, um diploma, a carteira de motorista, enfim, queremos desempenhar efetivamente o que já nos consideramos capazes de realizar.  Os sonhos se sobrepõem à realidade. Buscamos a independência e desejamos erguer nossas bandeiras para conquistarmos o mundo, convictos de que conseguiremos.  
Já adultos e inseridos no mercado de trabalho, nossa visão se estreita. O ritmo acelerado dos dias nos consome. Nosso mundo se reduz. Os sonhos são encaixotados na alma à espera que nos sobre tempo um dia. Já não desejamos mais que ele voe; nossa pressa deixa de existir e em contrapartida, o tempo é que parece se apressar cada vez mais.
Mal conseguimos executar as atividades cotidianas, rotineiras, ligadas às obrigações profissionais e pessoais.  Reservar algumas horas para um lazer com família ou amigos nem sempre é possível. Às vezes chega-se a considerar lazer como desperdício de tempo tal a ânsia em acompanhar os ponteiros do relógio. Torna-se necessário organizar bem cada hora do dia para que tudo saia a contento e mesmo assim muitas vezes falhamos. 
Aquele tempo que antes se arrastava agora nos atropela.  Sua avidez nos suga e às vezes até nos cega.
Ocupados nas tarefas do dia a dia não nos damos conta dos anos que vão se acumulando em nossas vidas, até que chega a tão sonhada e também temida, aposentadoria.
Nesta etapa surge a preocupação contrária vivida anteriormente – o medo do excesso de tempo que agora nos parecerá sem pressa alguma.
Pois é justamente nessa fase que podemos observar que ele, o tempo, sempre caminha na mesma velocidade. Nunca retarda ou acelera seus passos. 
Nós sim que desequilibramos o tempo, aceleramos nossas vidas e muitas vezes esquecemo-nos do essencial, que é vivê-las.
A vida não é eterna!
Lembro-me agora do diálogo entre Alice e o Coelho*:

Alice: Quanto tempo dura o eterno?
Coelho: Às vezes apenas um segundo.


Santos, 09 de junho de 2013


*Alice no País das Maravilhas – Lewis Carroll