sexta-feira, 16 de setembro de 2011

O JANTAR


Reuniões e cursos em São Paulo a despeito do cansaço e preocupação que geravam, normalmente eram acompanhados de fatos hilários. Sempre alguém distraído ou desinformado cometia alguma gafe. Às vezes ela era discreta e somente presenciada por pessoas próximas; outras vezes a gafe era colossal e testemunhada por muita gente.
Numa dessas estadias na Capital, por falta de vagas no hotel onde costumeiramente se hospedavam, acabaram instalando-se em outro localizado no chamado centro velho da cidade, numa região conhecidamente perigosa e mal frequentada principalmente à noite.
Não se importaram com esse detalhe e combinaram que na volta do curso já no final da tarde, comprariam em uma lanchonete próxima, pães e frios para um lanche a ser comido no próprio quarto do hotel.  Assim não teriam necessidade de saírem à noite e correrem riscos desnecessários.
No segundo dia de curso uma delas sugeriu que em vez de comerem lanches, fossem jantar num restaurante que ela havia visto pertinho do hotel. A amiga concordou no ato, pois gostou da idéia de dar uma saída para não ficar entocada no quarto.
Após o banho relaxante ambas arrumaram-se caprichosamente, afinal iriam jantar fora na Capital! Depois de inúmeras olhadas e conferidas do visual no espelho, desceram garbosas em direção ao restaurante.  Já na porta do hotel, a autora da idéia indicou a direção e de fato, poucos passos à direita havia um restaurante bem apresentável.
Cardápios escolhidos e servidos, resolveram prolongar um pouco mais a estadia, pois o ambiente estava agradável e mais animado do que o quarto que as esperava.
Bem na direção da mesa que ocupavam, havia uma porta pela qual um ou outro freguês passava após quitar suas despesas.  Algumas vezes era por ela que chegava novo cliente. O fato despertou a curiosidade de ambas. Para onde levaria aquela porta? Seria uma passagem secreta? Por que somente algumas pessoas a usavam?
Ficaram com olhos fixos na porta torcendo para que num momento qualquer alguém a escancarasse mais permitindo assim, uma olhadela no que havia do outro lado. Isso acabou não acontecendo e elas decidiram ir embora, mas com a curiosidade acentuadíssima.
Sentindo-se muito importantes e ousadas foram corajosamente para a tal rua perigosa; dados alguns passos já estavam no hall do hotel sãs e salvas.
Estavam na portaria retirando a chave quando notaram ao lado do balcão, uma porta bem semelhante àquela que haviam examinado há pouco.
Para surpresa maior de ambas nesse momento a tal porta foi aberta e puderam observar através dela, nada mais nada menos do que o próprio restaurante onde se encontravam há poucos minutos.
O funcionário observando os olhares apalermados para não dizer patéticos das hóspedes, solícito tratou de esclarecer:
- Se desejarem jantar é só passar por essa porta que estarão em nosso restaurante. Hóspedes têm descontos especiais.
Sem nenhuma palavra e segurando muito o riso, dirigiram-se ao elevador. Uma vez dentro dele as gargalhadas vieram com tal intensidade, que uma delas perdeu o controle do chamado ato fisiológico de urinar e acabou batizando literalmente o chão do elevador.
A classe e elegância esbanjadas na saída triunfal para jantar fora, foram substituídas por atos nada recomendados em público.
Por sorte ainda não havia se espalhado a síndrome das câmeras que no caso poderiam ser chamadas sem nenhuma dúvida, de câmeras de vigilância sanitária!!!

Santos, 16 de setembro de 2011   



Uma homenagem e um convite:
Vamos jantar fora Cleide ?????
O restaurante é logo ali....

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

MODERNIDADE VERSUS CAIPIRICE


Uma convocação diferente surgiu naquela semana.
Deveria estar no sábado pela manhã em São Paulo, para assistir uma palestra sobre Ensino à Distância. 
A princípio não curtiu muito por ser em pleno sábado porem animou-se com o local, no começo da Av. Paulista, já que poderia passear um pouco pelas redondezas depois da palestra.
Endereço anotado e trajeto até o local devidamente estudado, mal o sol apareceu e lá foi ela de ônibus com destino à Capital.
Conhecia um pouco o local bem como a estação de metrô onde deveria descer.
Fez o percurso sem maiores problemas até que chegou ao endereço determinado.
A princípio achou o prédio muito bonito e ousado. Ficava numa esquina e se destacava dentre os outros da vizinhança.  Era o prédio do Itaú Cultural próximo ao metrô Paraíso.
Olhou atentamente o edifício e contornou-o várias vezes procurando a porta de entrada. Nesse seu vai-e-vem observou que entre as pedras da calçada, havia algumas fotos em preto e branco trazendo cenas e pessoas ligadas à cultura brasileira. 
Achou a idéia muito feliz e enquanto se deslocava de um lado para o outro procurando como entrar, teve o máximo cuidado em não pisar sobre tais fotos.  Notou através dos vidros algumas pessoas já no interior do prédio e isso a deixou mais intrigada e perguntando-se por onde essas pessoas haviam entrado.
Após alguns bons minutos chegaram dois rapazes, pisaram sobre uma das fotos (fato que ela considerou de imediato, uma falta de respeito) e para seu espanto, milagrosamente uma porta se abriu. Nesse momento riu de si mesma. Havia se deslocado várias vezes na calçada e sempre pulando as fotos. Sua atitude que julgava ser um sinal de grande respeito, na verdade tinha sido uma grande burrice, para não falar caipirice mesmo.
O primeiro obstáculo estava vencido.  Com as anotações em mãos dirigiu-se ao elevador justamente com duas jovens cujas conversas a fez deduzir que se dirigiam para a mesma sala. Nem se preocupou em saber o andar uma vez que as companheiras de subida já haviam acionado o botão necessário.
Mais uma etapa cumprida e lá estava aguardando o início dos trabalhos durante o qual anotou atentamente todas as orientações repassadas. 
Ao final da palestra foi anunciado que na sequência outro assunto seria abordado, assunto esse que já não dizia respeito às atividades normais de seu trabalho, fugindo totalmente ao seu interesse.  Como já se aproximava o final da manhã resolveu retirar-se.
Desta vez entrou sozinha no elevador e foi ao painel procurar o botão T ou 1 que a levasse ao piso térreo.
Surpresa! 
Não havia números no painel.  Encontrou uma série de nomes de personalidades ligadas à cultura. Cada pavimento tinha um nome próprio. Decidiu apertar o que ficava abaixo de todos julgando ser o térreo.  Quando a porta do elevador abriu, viu-se numa garagem.
Resolveu apertar outro botão um pouco acima e novamente ficou surpresa pois estava provavelmente no 3º ou 4º andar. Saiu pelo corredor procurando alguém que lhe ajudasse mas não havia viva alma circulando por eles já que era um sábado.
A essas alturas e apesar do sufoco, ria sozinha pois inicialmente não conseguia entrar no prédio e agora não conseguia sair e estava fazendo um verdadeiro tour pelos andares do edifício.
Começou a apertar um por um cada botão do painel até que finalmente numa dessas tentativas ao abrir-se a porta do elevador, viu através dos vidros do prédio, carros circulando na rua.  Finalmente havia chegado ao térreo.  
Antes que alguma outra surpresa surgisse, tratou de sair correndo do elevador e do edifício. Já na calçada respirou aliviada. Chegara a pensar que passaria o final de semana subindo e descendo de elevador, presa no prédio do Itaú.
Decididamente há uma grande incompatibilidade entre ela e certas modernidades.

Santos, 05 de setembro de 2011