Não há a menor dúvida sobre a
importância de um animal de estimação em nossas vidas, seja ele qual for. É bom lembrar que a recíproca também é muito
verdadeira.
Quem já não teve, tem ou pretende
ter um dia, um animalzinho como companheiro para todas as horas?
Gatos e cachorros são os mais tradicionais
companheiros dos homens, e que companheiros!
Alguns são mais brincalhões,
vivazes e se criados com toda liberdade, fazem estripulias na casa até na fase
adulta.
Foi assim com o cachorrinho que o padre e também professor
de Português, criou em sua casa no final dos anos 70.
Não recordo mais o nome do bichinho, mas sei que era
um nome próprio masculino e que por causa disso, o padre já havia tido
problemas com um xará do animal que se sentiu ofendido com este fato.
Pois não é que este cãozinho criou o maior problema
para o padre e para a escola!
Apesar de sempre ser avisado que os diários de classe
deveriam ficar nos armários da escola, o padre com pressa de voltar para sua
cidade após a última aula da noite que acabava às 23h, saia praticamente voando
da sala em direção ao seu fusquinha e levava consigo todo e qualquer material
que estivesse em suas mãos.
Os demais professores que eram seus companheiros de
viagem também corriam para não ficarem para trás.
Numa certa tarde já no início do terceiro bimestre do
ano letivo, o padre professor distraído por sua própria natureza, esqueceu
todos os diários de classe sobre sua cama.
Quando foi pegar o material para ir trabalhar à noite
na escola, teve uma grande surpresa!
Todos os diários de classe estavam quase que
totalmente comidos e devidamente mastigados pelo cachorrinho que, a exemplo de
Erasmo Carlos, havia feito uma festa de arromba com todos aqueles papéis sobre
a cama de seu dono.
Não lhe restou alternativa a não ser recolher o que
sobrou de tudo e se dirigir para a escola já sabendo da confusão que arranjara.
Ainda lembro perfeitamente da cena que presenciei no
momento em que ele relatava os fatos para uma assustada e horrorizada
secretária de escola.
Com os braços para trás do corpo, segurando firmemente
os frangalhos dos diários de classe, o padre começou a contar a história bem de
leve, pelas bordas como se costuma dizer.
A cena foi hilária. A expressão facial do padre, muito
sem jeito, tentando explicar a ela o inexplicável, enquanto balançava nervosamente
os restos dos diários de classe ainda escondidos atrás de si.
À medida que ele aprofundava o assunto, os olhos da
secretária se arregalavam mais e mais até que finalmente deu um grito ao ver o
estado crítico e desesperador dos documentos.
O espanto foi grande já que o professor, talvez em
virtude de sua vida um tanto corrida, não havia entregado ainda para a
funcionária, as anotações de faltas e notas relativas aos dois primeiros
bimestres do ano.
Sendo assim, tais informações só existiam até aquele
fatídico dia, nos diários de classe que haviam se transformado em farrapos.
Ao saber deste detalhe, um “mero” detalhe, diga-se de
passagem, compreendi o motivo do desespero da secretária e a indignação da
diretora que chegou logo a seguir, após ouvir as exclamações desesperadas
vindas da sala ao lado.
É bom lembrar que naquela época ainda não existiam os
computadores.
O professor se justificou citando o nome do cachorro
como o responsável pelo estrago.
As duas mulheres o interromperam querendo saber como
alguém em plena sanidade mental poderia ter mastigado os papéis, já que para
elas o nome próprio masculino que o cachorro tinha, remetia a um homem ou a um
garoto.
A confusão durou um bom tempo e o problema criado mais
ainda.
Não me lembro de como tudo se resolveu depois, mas a
partir daquele dia os acompanhantes do padre em suas alucinantes viagens
noturnas de volta para casa, passaram a ter mais alguns segundinhos de tempo
para a carona, já que os armários da escola passaram a ser devidamente usados por
todos os professores, inclusive o padre.
Santos, 19 de maio de 2014.
Aos amigos
professores dos tempos de Ipeúna/SP e em especial ao querido Padre Quirino Volani
(in memoriam).