Ficar de mau humor perto
dela é meio difícil, diria até que é quase impossível.
A despeito das correrias
do dia a dia, dos tropeços que se dá, das dificuldades que vira e mexe nos
tiram a paz, há pessoas que "tiram
isso de letra" como se diz popularmente, e não perdem o bom
humor.
Ela é assim.
Já a vi brava, irritada
e com vontade de socar alguém, mas estes sentimentos são tão rápidos, tão
passageiros, que mal lhe tiram o sorriso dos lábios.
Aliado a tudo isso,
parece que sempre as confusões acontecem com ela ou de certa forma a envolvem e
ouvi-la contar os casos, é gargalhada na certa.
Foi isso e mais um pouco
o que aconteceu num final de semana prolongado, durante uma viagem a Santos.
Como combinado com sua
mãe, foi de carona até a rodoviária para pegar o ônibus com passagem já comprada. Sua amiga tomaria o mesmo ônibus, mas numa
cidade vizinha onde o veículo faria uma parada.
Pouco antes de chegarem
ao local do embarque, ela se deu conta que havia esquecido sua
"singela" bolsa, totalmente dourada e com mais de meio metro de
comprimento. Nela estavam objetos de uso
pessoal, documentos e a passagem que iria usar.
Nervosa com o imprevisto, ficou até aborrecida com o fato da mãe não ter
notado que ela esquecera a "discretíssima" bolsa.
Apesar de já atrasadas,
não houve jeito a não ser dar meia volta rumo à residência.
Mesmo sendo rápidas não
conseguiram retornar à rodoviária antes da partida do ônibus.
Sabendo
que ele faria também uma outra breve parada numa cidade anterior à que sua
amiga estava, não teve dúvidas: decidiu ir de carro até onde a companheira aguardava,
na certeza que ultrapassaria o tal "busão"
no caminho, enquanto ele entrasse no lugarejo.
Desta forma embarcaria junto com a amiga.
De imediato tomou a
direção do carro alegando que era mais rápida ao volante e partiu a toda
velocidade. Pela "estrada afora ela
foi bem contente"*. Não usava um chapeuzinho vermelho, mas tinha uma bela e imensa bolsa douradíssima.
No banco do carona, a
mãe pedia-lhe que fosse mais devagar, que iria provocar acidente e outros
conselhos mais do que pertinentes, mas a vontade de alcançar o tal veículo era
maior. Foi-lhe até sugerido que ligasse
para o celular do motorista pedindo-lhe para esperá-la, mas essa hipótese não tinha
como ser considerada por motivos óbvios.
O que ela imaginava
realmente aconteceu, ou seja, chegou na rodoviária da cidade vizinha minutos
antes do ônibus. Conseguira ultrapassá-lo na estrada. Juntamente com a amiga,
embarcou sem maiores complicações.
Problema solucionado,
eis que surgiu nova situação.
A tensão nervosa e a
preocupação pelas quais acabara de passar, fez com que seu corpo, mais
precisamente seu sistema digestivo resolvesse dar sinais que iria
funcionar. Ela tinha pela frente uma
viagem de mais de 3 horas num veículo sem banheiro.
A cada minuto a aflição
aumentava e o jeito foi tentar se distrair com outras coisas e de vez em quando
falar para si mesma: "Calma, calma, espera mais um pouco que já
lhe atendo! Calma, agora não "totozinho", ainda não é sua hora!"
Suando frio conseguiu
controlar o organismo, mas ao chegar a seu destino, para espanto de todos, ela praticamente
voou da porta de entrada do apartamento para o banheiro e lá ficou por um bom
tempo.
Quando conseguiu sair,
contou e encenou detalhadamente todos os fatos com aquele seu jeito divertido,
e aí as gargalhadas foram gerais.
Aqui caberia um The
End, mas não foi o que aconteceu.
Um tempo depois ela
soube que a história ainda não havia acabado. Um novo personagem, um tal de Detran,
entrara triunfante no capítulo final.
Realmente com a correria
na estrada, ela conseguiu evitar a perda da passagem e dos reais que havia
gasto na sua compra, mas em compensação, quando chegaram as multas por excesso
de velocidade no percurso em que ultrapassou o ônibus, os reais que perdeu,
superaram em muito o valor da tal passagem, além de outras dores de cabeça.
O novo personagem tentou
ofuscar a protagonista, mas nem os dissabores a fizeram perder o bom humor. Foi
melhor nem fazer os cálculos e seguir em frente para novas emoções.
Hoje, problemas
resolvidos e superados, as peripécias da dona da bolsa dourada ainda provocam
risos ao serem lembradas.
A propósito, será que
ela ainda tem a bela, "recatada" e dourada bolsa?
Santos, 23/10/2016
* Música da
história infantil: O Chapeuzinho Vermelho.
Para Carolina e seu bom humor.