A noite foi
muito agradável num aconchegante barzinho em Santiago.
O frio não chegou
a atrapalhar já que havia vários aquecedores de ambiente colocados entre as
mesinhas na parte externa do prédio.
Música suave, gente bonita, um bom vinho chileno, tudo contribuíra para
marcar aquela noite como um belo final de férias e uma despedida, pois dali a
dois dias retornaria ao Brasil.
Sob uma
belíssima lua cheia caminharam lentamente pelas ruas retornando para casa
quando os relógios já anunciavam o início da madrugada de domingo.
Havia sido
cancelado o último passeio marcado para aquele dia prestes a nascer. Como era
para um local distante, perderiam muito tempo no trajeto o que prejudicaria a visita
em si.
Acomodaram-se
no apartamento do 10º andar e logo o sono chegou.
Passava um
pouco das 3 horas, já em pleno sonho, quando ela foi despertada pelo forte balanço
do colchão.
A princípio,
sem entender o que se passava , sentou-se na cama. Entretanto ao apoiar os pés
descalços no chão, a trepidação do piso não deixou mais dúvidas.
O apartamento
todo estava tremendo – era um terremoto.
Olhou pela
janela e observou que muitas pessoas já estavam na rua.
Chamou a irmã
avisando-a sobre o que acontecia e dizendo que deveriam sair do prédio com
urgência. Para seu espanto ouvi-a afirmar
que as pessoas estavam na rua, pois com certeza chegavam de alguma balada e enquanto
levantava-se calmamente, esclareceu que iria mesmo era para o banheiro pois
estava precisando.
Sem perder mais
tempo ela correu ao armário onde os cabides com as roupas balançavam muito. Vestiu
rapidamente uma jaqueta e calças compridas por cima do pijama mesmo. A
madrugada estava fria.
Nesse momento
a energia elétrica foi desligada e o barulho no apartamento já aumentara muito:
copos e louças caindo e quebrando no chão da cozinha, talheres pendurados no
apoio de metal batiam uns contra os outros tilintando como sinetas, um grande
quadro da sala despencou e as paredes estralavam sem parar.
Abriu a porta
do apartamento e deparou-se com o vizinho, um rapaz também brasileiro, que
apavorado tentava usar o celular sem êxito.
Nesse momento
seu sobrinho que estava no 13º andar surgiu descendo rapidamente as escadarias chamando-as
para saírem do prédio.
Os moradores chilenos
também já desciam correndo e precavidos, carregavam uma garrafa de água e uma
lanterna nas mãos.
Com certeza ela
bateu algum recorde de velocidade ao descer na semi-escuridão, do 10º andar até
o térreo.
Na calçada
grande número de pessoas assustadas procuravam informações enquanto os tremores
diminuíam de intensidade.
Com a luz e o serviço de telecomunicações cortados, a
única notícia obtida veio do radio de um carro que foi sintonizado numa estação
retransmissora de Mendoza na Argentina.
O abalo sísmico havia sido realmente forte: 8,8 na Escala Richter.
O clima era
de medo e apreensão e muitos moradores estavam enrolados em lençóis e cobertores,
pois a madrugada estava fria.
Com certeza ela
era uma das únicas pessoas bem agasalhada e até com sua bolsa com documentos.
Trazia também a máquina fotográfica que foi usada apenas para registrar os
danos nos prédios da região, evitando clicar as pessoas pois o clima estava
tenso.
Por sorte o edifício
onde estavam bem como os vizinhos, praticamente não sofreram danos. Eram construções
recentes que seguiram as exigências legais necessárias para suportarem tremores
de terra de alta magnitude.
Uma rápida
caminhada pelo bairro ainda na madrugada mostrou alguns estragos em estruturas
de igreja, casas comerciais, vidros de vitrines, trincas em paredes, etc.
Somente por
volta das 9h da manhã os moradores ainda receosos, começaram a retornar aos
seus apartamentos.
Apesar do
sono não havia mais condições para relaxar e dormir tranquila depois de toda
aquela aventura.
Como o
aeroporto ficou fechado nos primeiros dias que se seguiram, a viagem de retorno
foi atrasada em uma semana.
Nesses dias pós-terremoto,
foram constantes as chamadas réplicas, com tremores de curta duração mas que
assustavam muito e faziam o coração disparar.
As
consequências dessa madrugada foram trágicas para muita gente e para o país.
Para ela foi realmente
uma viagem inesquecível, não só pela beleza dos lugares visitados, como também
pela intensa e inédita emoção sentida, emoção essa que espera nunca mais
vivenciar.
Prédio que resistiu intacto aos tremores
Isla Negra - Vista da praia a partir da casa de Neruda.
Casa de Neruda em Isla Negra