domingo, 30 de novembro de 2014

ESQUECERAM DE MIM - VERSÃO CAMPINEIRA

          





       Creio que dificilmente haja alguém que nunca tenha assistido, ou ao menos ouvido falar, sobre o filme Esqueceram de Mim, lançado em 1990, com Macaulay Culkin no papel principal como o garoto Kevin.

          Esta época pré-natalina é ocasião propícia para que os canais de TV reprisem este filme pela milionésima vez, bem como os outros que o sucederam: Esqueceram de Mim 2 - Perdido em Nova York e Esqueceram de Mim  3.

         São comédias leves que agradaram ao público e tornaram o ator mirim famoso no mundo todo.

         Estes esquecimentos entretanto, não são tão incomuns e não acontecem somente nas ficções cinematográficas. 

          Pois  bem, aqui em plena terra brasilis também tivemos a versão feminina de Kevin, na antigamente chamada Terra das Andorinhas.

          Embora o fato tenha ocorrido num tempo mais curto e fora da ambientação natalina, poderia também concorrer ao Oscar de trapalhada familiar.

         Como de costume, o casal e filha pequena, após almoçarem no restaurante dirigiram-se ao carro estacionado em local próximo.

         É fato comprovado que a rotina nos leva a fazer coisas como se tivéssemos ligado o chamado piloto automático. Este fato associado à distração, acabou acarretando uma cena inusitada.

          A garota guardou a mochila escolar no porta-malas e o casal entrou no carro que logo em seguida foi posto em movimento deslocando-se rua acima.

         Passados alguns momentos, quando já haviam percorrido uma certa distância, eis que o celular da mãe começou a tocar. 

           Antes de atender ela observou no visor do aparelho, que era a filha chamando-a.

        Julgando ser brincadeira da menina, antes mesmo de atender ao chamado, a mãe indignada virou-se para trás já dando a maior bronca bem no estilo italiano, indo de maledetta até porca la pipparola.

          Surpresa!!!

          O banco traseiro do carro estava vazio, absolutamente vazio.

          Assustada, virou-se para o marido perguntando pela menina.  

          Ele que até então imaginava a filha sentadinha no banco de trás, brecou rapidamente o carro ao mesmo tempo em que a esposa atendia ao chamado do celular.

        Era a menina que muito brava avisava que havia sido deixada para trás. Estava na calçada em frente ao restaurante.

         A princípio ao ver o carro partir, a filha julgou que era brincadeira dos pais e esperou um pouco.

        Entretanto como o veículo já se distanciara muito e não havia a menor menção que iria parar, concluiu que realmente fora esquecida.  

          O jeito foi recorrer ao celular para solicitar seu resgate.

          Ainda bem que nestes tempos modernos puderam contar com a tecnologia. 

        Caso contrário, a menina teria que esperar até os pais chegarem em casa e notarem sua falta.

     A Kevin campineira teve mais sorte que seu correspondente americano - foi resgatada em pouco tempo.

        Resgate efetuado e mais uma trapalhada familiar resolvida.



Santos, 30 de novembro de 2014. 




sábado, 15 de novembro de 2014

O PROFESSOR TEXANO


Os dias eram curtos para darem conta das atividades das quais participavam.
Exerciam o magistério em cidades vizinhas e um dia por semana já era reservado para ida a São Paulo onde cursavam matérias da pós-graduação na USP. Os três períodos do dia e às vezes madrugadas, eram destinados ao trabalho e estudo.
Em um determinado semestre as duas amigas receberam um pedido do professor orientador da pós.  Um geneticista texano viria a São Paulo, convidado que fora, para ministrar uma série de palestras semanais no departamento de Genética Animal da USP.
Ocorreu porém que não houve inscrições na quantidade mínima exigida para que o evento fosse autorizado.  Faltavam exatamente duas inscrições.
Era justamente isso que o orientador desejava: que ambas se inscrevessem para completar o total necessário.
As palestras seriam dadas por este professor texano que não falava absolutamente nada em  português e portanto o evento seria totalmente no idioma inglês, sem tradução simultânea ou posterior.
Este fato por si só já as excluía de imediato como possíveis alunas, pois mal dominavam o idioma estrangeiro para traduções com direito ao uso do dicionário.  Conversação em inglês era algo que estava totalmente fora de cogitação já que não tinham a menor condição para isso.
Entretanto, o tempo exíguo que havia para o término das inscrições e a necessidade premente que o ciclo de palestras ocorresse, já que era importante para algumas pesquisas específicas de outros pós-graduandos, fez com que o orientador lhes assegurasse que assumiria qualquer problema que por ventura viesse a ocorrer por causa das dificuldades com o idioma.
Inscrições feitas e aulas iniciadas, as amigas sempre tinham o cuidado de sentarem mais ao fundo da sala e evitarem qualquer participação maior. Entendiam um termo aqui, outro ali, uma frase inteira acolá, mas não saia muito disso.
O professor texano falava muito rápido e às vezes até os que dominavam seu idioma, pediam-lhe que se expressasse mais pausadamente.
Ao final do semestre quando já estavam na penúltima palestra, as amigas tiveram que faltar por causa de imprevistos particulares.
Não contavam, entretanto, com o fato do professor vir a sentir suas ausências naquele dia. De imediato perguntou sobre elas ao professor orientador. Foi informado que tais alunas eram do interior e viajavam a São Paulo para assistirem suas palestras e que provavelmente haviam tido algum problema com o transporte.
Na semana seguinte, as amigas compareceram alegres e felizes já que era a conclusão do tal ciclo de palestras.
Nem bem chegaram e foram avisadas por colegas, que o texano desejava conversar com ambas, pois se dispunha a acertar uma data para a reposição exclusivamente para elas, da aula que haviam perdido.
Foi o que bastou para ligarem o sinal de alerta e evitarem ao máximo, dar uma oportunidade a ele de vir ao encontro delas.
Creio que naquele dia elas fugiram mais do texano do que o diabo já fugiu da cruz.
Entraram na sala quando a aula já havia iniciado e como sempre, em local discreto. Ao ser anunciado o intervalo, saíram praticamente voando.
Naquele dia ficaram sem o esperado cafezinho saboreado com todos os colegas e professor. Mantiveram-se em local seguro e distante das vistas enquanto durou o intervalo.
Quando calcularam que fosse o momento ideal para voltar à sala, levaram o maior susto. A porta do elevador se abriu e dentro dele estava justamente a pessoa que mais evitaram a manhã inteira. Foi por muito pouco, mas conseguiram disfarçar e se afastar quase correndo. A crise de riso que se seguiu foi inevitável.
Finalmente retornaram para a classe quando a segunda parte da aula já estava em andamento.
Ao encerrar a série de palestras o professor começou a se despedir e ao dizer o primeiro BYE elas saíram quase se atropelando da sala e foram tão rápidas que no segundo BYE que ele pronunciou, já entravam no elevador.
Estava encerrada a série de palestras com tema central que elas conheciam bem, mas cujos conteúdos jamais saberão.

Do you understand English?
Yes, I do.  The book is on the table!

                     E tenho dito!  Ops...And I have said!

Santos, 15 de novembro de 2014 

Para Vera, recordando a cena do elevador e a crise de riso que tivemos em seguida.  I can't believe we did it.




domingo, 9 de novembro de 2014

OS PENETRAS



Há aproximadamente um ano não nos vemos ao vivo e a cores.
Na verdade não nos vemos nem virtualmente, já que entre ela e a tecnologia que a informática oferece, há uma incompatibilidade atroz.  Quando há necessidade de enviar informações a alguém, costuma perguntar se pode mandar por malote, recordando o tempo em que esse meio era usado com frequência.
A despeito deste distanciamento físico, sorrio sempre que me lembro dela.
Trabalhamos na mesma sala por um certo período e nesse tempo pude conviver com uma profissional responsável, competente e com um grande senso de humor.
Dona de uma fina ironia, provocava boas risadas com suas observações feitas na sala de trabalho que ficava justamente ao lado da sala do chefe, famoso por sua seriedade.  Suas frases espirituosas e hilárias conseguiam despertar sorrisos até na face do circunspecto chefe.
Recentemente li uma divulgação sobre a abertura de novo restaurante na cidade.  Tal fato levou minhas lembranças diretamente a ela, provocando risada mesmo após transcorridos tantos anos.
No período em que trabalhamos juntas, houve a inauguração de um belo restaurante na região central da cidade.
Ao ficar sabendo de tal evento, achou uma boa ideia almoçar com a família neste local, já que era um belo sábado de sol.  Todos concordaram com sua até então, brilhante sugestão.
Logo na entrada do restaurante notaram um grande movimento e o atribuíram à curiosidade natural.  Consideraram que todos queriam conhecer e experimentar os serviços do novo local.  
À medida que caminhavam pelo corredor central, observaram que a maior parte das mesas já estava ocupada por pessoas muito bem arrumadas e elegantes, mas que nunca haviam visto. Todas os olhavam com certo ar de surpresa e principalmente curiosidade, já que a família estava em trajes bem esportivos e descontraídos, adequados para uma tarde quente de sábado no clube.
Quando já estavam no meio do corredor à procura de uma mesa vazia, avistaram um conhecido.  Cumprimentos trocados e eis que o amigo diz que desconhecia que haviam sido convidados também.
- Convidados para quê?  ela perguntou já com medo de ouvir a resposta.
O temor tinha razão de ser.
Era um casamento cujos noivos que eles não conheciam, haviam reservado o restaurante todo para receberem os convidados para a festa, diga-se de passagem, uma elegantíssima festa.
Descobriu tarde demais que não havia lido a notícia sobre a abertura do restaurante com atenção e se confundira com os dias.
A inauguração do local para o público em geral, seria no dia seguinte, no domingo.
À família não restou outra opção a não ser virar literalmente nos calcanhares e se retirar sem nem olhar para os lados, mas sentindo todos os olhares em sua direção.
Já na rua ela tentou se justificar mas foi em vão, afinal havia acabado de fazer a família  pagar um grande mico transformando-a em penetra de festa alheia, com direito à entrada triunfal e saída mais triunfal ainda.
Longe de constrangê-la, este fato foi contado e até teatralizado por ela, causando muitas gargalhadas, inclusive do severo chefe.
Com muita propriedade, Caio Fernando Abreu já disse:
“Você percebe que as pessoas são inteligentes quando elas conseguem rir de si mesmas. Gente ignorante só consegue rir dos outros.”
Saudades de você Rosmari!

Santos, 9 de novembro de 2014

Uma homenagem à Rosmari e seu excelente senso de humor.
Qualquer dia conto a história de como saindo na estrada para ir a Ipeúna, você chegou triunfalmente em.........Ajapi...rsss.

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

XÔ TRISTEZA!



Creio que isso aconteça com muita gente.
Acordo às vezes sentindo uma tristeza profunda e o que é pior, não sei o motivo.
Esse fato não é comum, mas me incomoda justamente porque passo horas do dia com aquele aperto no peito e pensando no que poderia estar provocando a sensação ruim, que já chegou a durar uns dois ou até três dias seguidos.
Claro que busco me distrair com leituras agradáveis, boas companhias e evito ler ou assistir qualquer fato mais deprimente, mas como se fosse um iceberg, aquela ponta de tristeza vez ou outra, consegue emergir e eis de volta a sensação desagradável.
Sempre fui emotiva e sei também que ficamos mais ainda com a idade (embora eu seja muito jovem...rs), mas nestas ocasiões de tristeza sem causa aparente, me vejo chorando até em propaganda de papel higiênico.
Há alguns dias estive assim, nesta fase um tanto baixo astral.
Embora eu seja totalmente leiga e até um tanto cética em relação à astrologia e signos de um modo geral, cheguei até a pesquisar (dá-lhe Google) sobre o chamado inferno astral, já que estava na semana anterior ao aniversário.
Consulta feita e não cheguei à conclusão nenhuma.
Agora, enquanto fazia pequenos serviços domésticos (depois de aposentada, virei “do lar”) sintonizei o som na estação chamada Radio Saudade FM 100.7 MHZ, aqui de Santos.
Gosto de sua programação.  Acho até que vou pedir um “cachezinho” por esta propaganda.
Assim que sintonizei a rádio, ouço a voz de Maysa cantando um de seus sucessos, Bom dia Tristeza, composta por Vinícius de Moraes e Adoniran Barbosa. 
Aliás, abrindo um parêntese aqui, esta música tem uma história interessante, já que Adoniran e Vinícius nunca se encontraram e naquela época, internet não existia.
Segundo relatos, Vinícius escreveu o poema num guardanapo de papel e entregou-o a Aracy de Almeida, em Paris.  A cantora era amiga de Adoniran. De volta ao Brasil, mostrou-lhe os versos que empolgaram tanto ao sambista que ele resolveu musicá-los.  Assim nasceu a composição Bom Dia Tristeza.
Pois bem, fechando o parêntese, eis que ouço na rádio a bela voz de Maysa. Parei um pouco e fiquei refletindo sobre os versos.  Em seu poema, Vinícius diz que a tristeza vinha do fato de amar.
Até o amor causa tristeza.
Talvez então seja isso.  A gente ama a vida, ama os amigos, ama tantas coisas que infelizmente, por circunstâncias diversas, muitas vão se perdendo ao longo da vida. Em alguns casos, a perda é definitiva. 
Seres que amamos e que partiram antes nos fazem falta, e nosso inconsciente acorda vez ou outra lembrando tais perdas.
Assim como veio, aquela sensação ruim se foi.
Sou e sempre fui mais pela alegria, pela admiração à vida, pela natureza e por momentos simples mas carregados de sentimentos e sensibilidade.  Momentos que passam ao largo de bens materiais, mas que fazem realmente a vida valer a pena.
E relembrando Vinícius em seu Samba da Bênção ... “É melhor ser alegre que ser triste, alegria é a melhor coisa que existe”....
Por isso, hoje deixo de lado a bela música na voz de Maysa, e fico mais com Drummond e seu poema sobre felicidade. 

VOCAÇÃO PARA A FELICIDADE
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

Não escreverei versos chorosos, cantando tristezas infinitas,
amores impossíveis, saudades dolorosas,
paixões trágicas e não correspondidas.

Tenho a vocação para a felicidade.
Ser feliz não me traz sentimento de culpa.
Não preciso da tristeza para justificar a inutilidade da vida.
Não preciso morrer e ir ao céu para encontrar a felicidade.
Quero-a e tenho-a neste espaço terreno do aqui e do agora.

A felicidade, tal e qual o amor, está dentro de mim
E transborda em ternuras, em melodias,
em carinhos, em alegrias, em cantos e encantos.

Sou feliz e não preciso me justificar.
Sorrio sem ver passarinho verde.
Não tenho medo de ser feliz.

Faço minha estrela brilhar.
Sem receio dos encontros, desencontros,
encantos e desencantos que o amor me diz.

Contrariedades? Eu as tenho.
E quem não as tem na vida secular?
Escassez de dinheiro? Nem é bom falar
Amores não correspondidos? Separações?
Rejeições? Saudades incuráveis?
Carinhos reprimidos, ternuras guardadas,
sem a contra parte do outro?
Eu tenho aos montões.
Sou a rainha das perdas, necessárias ao meu crescimento.

Contudo quem não soube a sombra não sabe a luz.
E num livro de matemática existencial
juntei todos esses problemas insolúveis,
com as respostas nas últimas páginas.
Mas pra que me debruçar
sobre eles, procurando a solução
se a própria vida me conduz
a resposta final?

Sem medo de ser feliz vou por aqui e por ali
por onde os caminhos, as trilhas,
Os atalhos me levarem, traçando meu rumo.
Às vezes com alguma tristeza,
mas quem disse que felicidade
é o contrário de tristeza?
Tristeza é só uma momentânea falta de alegria!

É, amigo, amanhã é sempre um novo dia
E quando a infelicidade passar por aqui,
minhas malas estarão prontas
para eu ir por ali.

..................

Que tal despertarmos em nossa alma, a vocação para a felicidade?


Santos, 5 de novembro de 2014