quinta-feira, 31 de maio de 2012

PALAVRAS NO VAPOR


     Ao longo do dia as tensões se acumularam sem que ela conseguisse um momento sequer para respirar fundo.
     Era preciso dar a dimensão exata a cada preocupação.
     Deslocando-se de um local a outro, olhou no relógio e sentiu-se atropelada pelo tempo.
 Receou que aquele dia estivesse irremediavelmente perdido.
     De fato foram horas conturbadas, mas conseguira já bem no final da tarde, administrar razoavelmente todas as questões.
     Finalmente em casa, recebida pela alegre cachorrinha branca, conseguiu esquecer um pouco as atribulações que a acompanharam por todo o dia.
     Já no chuveiro, a água morna escorrendo em seu corpo foi como uma bênção para acalmar a dor de cabeça e relaxar os músculos.  A sensação foi tão boa que quando se deu conta estava cantarolando. Sentia-se bem mais leve.
     Ao observar que as paredes do banheiro estavam embaçadas, um comportamento infantil lhe veio à mente e se pôs a escrever versos no vapor.  Soltou a imaginação na ponta do dedo desenhando as palavras que lhe vinham à mente.
     A noite de sono reparador ajudou a clarear as ideias e na manhã seguinte já estava pronta para enfrentar a maratona novamente.
     Dessa vez a rotina do dia de certa forma foi tranquila.
     No começo da noite como sempre, a recepção que recebeu assim que entrou em casa a fez esquecer o trabalho.  Rolou no tapete da sala enquanto brincava com a cachorrinha.
     Na hora do banho eis que teve uma surpresa!
     Assim que a água quente do chuveiro começou a escorrer, o vapor novamente surgiu nas paredes à sua volta, dando vida às palavras lá anotadas na noite anterior.
     Leu emocionada os poemas escritos em momentos de lirismo e inspiração.
     A seguir, passou a mão sobre cada verso, sobre cada letra, juntando as gotículas de água que escorreram levando seu poema parede abaixo.  
     Apagou assim as palavras escritas, mas as reteve na alma.
     Escrever palavras no vapor é como deixar uma mensagem secreta.
  As letras somem momentaneamente para reaparecerem de surpresa no próximo "embaçamento", revelando a espontaneidade de um momento.
     Quem de nós nunca escreveu confidências no vapor?


Santos, 30 de maio de 2012  

Texto a partir da frase:
"Nos banheiros de hotéis escrevi palavras no vapor, palavras essas que nunca mais irei lembrar, deixei-as de presente para Budapeste"  
in BUDAPESTE (24/11/2011) by Débora Vasconcelos.  Blog: www.extremosdemim.blogspot.com.br


10 comentários:

  1. Nossa, faltando 5 minutos para começar a trabalhar, eu li e me emocionei mais uma vez contigo Ligia. Lindo, lindo, lindo...me senti na pele deste seu escrito, os dias tem sido assim, pena que nao tenho uma cachorrinha branca...buáaaa. Fiz um escrito baseado numa frase sua também, mas ainda não tive tempo de digitar...Coração nao Tem Bussula. vou tentar hj a noite e posto no Blog. Obrigada pela surpresa. Bjsssssss

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  2. Escrever histórias...lindas assim, é uma ode às palavras e aos sentimentos.

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  3. Débora, desde que fiz o comentário em seu blog fiquei com essa imagem das palavras no vapor e agora saiu o texto.

    Obrigada a vc e à Terezinha pela visita ao blog e pelas palavras de incentivo.

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  4. Lindo, Lígia! Sensibilidade pura!

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  5. Obrigada Selma. É o lúdico carregado de sentimentos.

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  6. Aula de relaxamento e sensibilidade que é dado a poucos privilegiados! Você é uma, Ligia. Não basta conhecer gramatica ou técnica de escrita, tem de ter leveza, sutileza, humor, ser sensível, observadora, algo de celestial! Parabéns.

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  7. Obrigada por suas palavras Elita e Lucinda. Obrigada também pelas visitas.

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  8. Obrigada Iara, pela visita ao blog e por suas palavras.

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