Uma mensagem recebida contendo um arquivo com materiais escolares que já caíram em desuso, lhe trouxe lembranças de um fato que literalmente quase a fez cuspir fogo.
Naquele dia estava sem carro e olhando o relógio considerou que havia tempo suficiente para ir a pé até uma escola que não era tão distante. Organizou o material de trabalho que usaria na reunião com os professores e sem maiores atropelos pôs-se a caminho.
Nos primeiros quarteirões percorridos começou a achar que a distância não era afinal tão pequena e que havia sido má ideia ir a pé. Estava quente demais e quase não havia sombras nas calçadas que lhe protegessem ao menos um pouco dos raios solares que queimavam a pele.
Na metade do percurso, suando demais e já sentindo o peso do material que carregava, conformou-se em continuar caminhando já que naquela “altura do campeonato”, não compensaria chamar um táxi.
Com passos cada vez mais lentos por causa do cansaço e do calor, chegou ao local da reunião quase se arrastando. Finalmente teria um pouco de sombra sobre sua cabeça!
Afoita e com a boca e garganta totalmente secas, entrou na sala onde os professores já a aguardavam fazendo um grande burburinho.
Antes mesmo dos cumprimentos formais, perguntou a uma funcionária onde havia água para beber. Solícita a jovem apontou para uma mesa no canto da sala onde havia alguns equipamentos pedagógicos, uma bandeja com vários copos de vidros e um galão branco ao lado.
Enquanto ela se dirigia até a tal mesa, uma professora veio ao seu encontro no intuito de lhe mostrar um trabalho que estava desenvolvendo. Tentou ser educada e dar atenção à pessoa que lhe falava mas na verdade naquele momento, só imaginava ter em suas mãos um gigantesco e transbordante copo com água.
Ainda ouvindo as explicações da professora abriu rapidamente o galão e virou-o enchendo um copo até a boca. Fez isso com tanta pressa que quase derramou o líquido sobre a mesa.
Ato contínuo entornou o copo em sua boca dando vários e grandes goles, bebendo com avidez aquele líquido que ansiava por tomar.
Foi quando sentiu que o mundo parou de repente!
Sentiu uma imensa queimação que começava na boca, descia pela garganta e revirava o estômago. Chegou a achar que seus olhos iriam saltar para fora das órbitas enquanto tossia sem parar. Lágrimas escorriam em seu rosto.
Sem conseguir falar, viu a expressão de pavor na face da professora à sua frente que não entendendo o que havia acontecido, perguntava insistentemente se estava passando mal.
A essas alturas várias pessoas já estavam até lhe abanando.
Passados alguns segundos, sua respiração voltou ao normal e ela aos poucos se recompôs. Pegou novamente o galão que estava ao lado da bandeja de copos, abriu-o e cheirou seu conteúdo.
Era álcool puro, puríssimo!
O galão branco que estava junto aos copos na bandeja, na verdade era galão de álcool que havia sido deixado ali de maneira irresponsável por alguém que o havia usado no equipamento chamado mimeógrafo* que estava na outra ponta da mesa. O galão com água estava na verdade dentro da geladeira.
As primeiras palavras que lhe vieram à mente ainda com os olhos lacrimejantes são impublicáveis mas as que acabou falando foram:
- Proibido acender fósforo ou isqueiro perto de mim.
Somente nesse momento é que as demais pessoas se deram conta do que havia acontecido e claro, não apareceu o insensato que havia deixado o galão ao lado dos copos. Sugeriram-lhe que bebesse água em seguida, mas ela se recusou ao lembrar que o álcool iria aquecer a água e aí sim acabaria cuspindo fogo.
Foi assim que ela até então abstêmia convicta, acabou caprichando em seu début tomando logo de vez, grandes e bons goles de puro álcool !
Santos, 31 de março de 2.012
* Instrumento utilizado para fazer muitas cópias de papel escrito ou com desenhos. Usado principalmente para fins escolares até o início da década de 1990.
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