O bom humor é um elemento essencial que deve constar na bagagem de qualquer viajante, principalmente se o destino for algum país onde não conheça a língua.
Cada passeio, o uso de transporte público, cada refeição e até uma simples ida ao banheiro, podem se converter num mico homérico.
No restaurante uma tática que surtiu um bom efeito foi olhar o prato do vizinho de mesa. Se o aspecto agradou, disfarçadamente chamar o garçom e apontando para o vizinho, indicar que se deseja exatamente a mesma coisa. Claro que há de se ter o cuidado de não ser observado pelo proprietário do citado prato. Mesmo assim, ainda há uma margem de erro, pois às vezes a quantidade é astronômica e o jeito é dar conta de tudo aquilo.
Numa dessas situações por exemplo, um pig (porco em inglês) acabou sendo confundido com um big (grande) e aí, quando o prato chegou, a cara de espanto de todos foi impagável.
Na bilheteria do teatro houve um momento que chegamos a desconfiar que fosse um índio tentando se comunicar com um alemão, usando a linguagem tupi-guarani. Saiu algo assim:
- Eu pagar ticket internet.
Como não houve compreensão nova tentativa foi feita e essa acarretou boas risadas de quem estava por perto:
- I buy tickets internet.
Entretanto o termo buy que significa comprar em inglês, foi pronunciado exatamente como se escreve e não bai que é a forma correta de se dizer.
Entretanto o termo buy que significa comprar em inglês, foi pronunciado exatamente como se escreve e não bai que é a forma correta de se dizer.
A gargalhada de quem conhece o idioma denunciou que algo estava errado, mas finalmente o alemão entendeu o que estava sendo falado.
No último dia do ano claro que o mico tinha que ser caprichado, e o foi com certeza.
Conseguiu-se literalmente parar o metrô de Viena.
Na pressa em entrar no vagão e carregando malas e mochilas já com um respeitável peso, uma sacola contendo um casacão preto caríssimo cometeu o atrevimento de cair justamente no vão entre a plataforma e o degrau do vagão.
Um grito de alerta foi dado e na indecisão sobre o que fazer no momento já que o sinal de partida do trem tocara, o grupo todo arrastando novamente as malas e mochilas, saiu correndo para fora do vagão de maneira toda atrapalhada, nada discreta, acertando as cabeças dos austríacos sempre tão bem comportados.
O trem partiu e na plataforma vazia ficaram os quatro turistas olhando a sacola caída no meio dos trilhos.
E agora, o que fazer? O casacão era emprestado.
A ideia de descer nos trilhos foi logo descartada pois os trens circulam com pouco intervalo entre um e outro.
A saída foi acionar o SOS da estação contando para isso com a ajuda de uma alemã caridosa. Em pouco tempo dois funcionários chegaram, desligaram a energia da linha e ligaram uma sirene com várias luzes vermelhas piscantes. Um deles desceu para resgatar o casaco suicida.
Diante do semblante totalmente carrancudo dos funcionários o quarteto de turistas brasileiros resolveu ficar silente, sem esboçar nenhum riso embora fosse enorme a vontade de gargalhar por terem parado a circulação do metrô em plena Viena.
Trabalho concluído e os trens voltaram a circular em poucos minutos.
Depois dessa o jeito foi partir para Veneza, pois por mais um pouco o grupo estaria na manchete em todos os jornais televisivos de Viena.
Viena, 31 de dezembro de 2011
Conto escrito a quatro mãos - Ligia e Luíza Cerri
Nota: para Luís Fernando cujo finíssimo casaco resolveu fugir e causar um problemão em Viena.