terça-feira, 15 de novembro de 2011

GOSTO NÃO SE DISCUTE

Pensando na frase acima lembro meu pai que sempre acrescentava um final a ela:  Gosto não se discute – lamenta-se!
A verdade é que realmente os seres humanos apresentam imensas diferenças de temperamento, competência, costumes, crenças, inteligência, senso de humor e maneira de encarar a vida.  No quesito gostar as divergências são gritantes. 
Isso é até salutar pois a monotonia dominaria nossos dias se todos pensassem de maneira idêntica e sobretudo se gostassem das mesmas coisas. A vida perderia o brilho e seria fastidiosa quanto previsível.
A escolha de nomes para registrarem os filhos é um dos momentos onde os diferentes gostos são expostos de maneira bem clara.  Nomes comuns muitas vezes são preteridos por justamente serem comuns.  A família busca algo que diferencie a criança e às vezes essa dita diferenciação realmente a tira do anonimato mesmo que seja em troca de um futuro trauma que o nome escolhido venha a acarretar.
Lembro-me de um senhor extremamente católico que a cada filho nascido consultava a folhinha e dava à criança, o nome do santo do dia. Um dos filhos desse senhor recebeu o incrível nome de Indepe do Brasil.
Explico: ele teve a infelicidade de nascer em 7 de Setembro e na folhinha não havia nome de santo, apenas o fato histórico que marcava a data.  Carregou ao longo da vida o peso desse nome juntamente com galhofas e brincadeiras quando explicava o motivo.
Trabalhando no magistério e convivendo por longos anos com turmas e mais turmas de alunos, o professor depara-se com uma miríade de nomes, alguns dos quais nunca mais se esquece. Pode não se lembrar muito bem do semblante do aluno, porém de seu nome exótico, não se esquece.
Particularmente convivi com muitos exemplos mas dois merecem destaque.  
Tranquilo foi um caso especial.  Acompanhei sua saga ao longo de quatro anos. Era um rapaz humilde, muito educado e tímido. Era o sossego em pessoa a tal ponto que chegava a irritar. Ele realmente personificava a tranquilidade. Não que não fosse inteligente ou tivesse dificuldades de aprendizagem; o que lhe faltava mesmo era dinamismo. Por ser alvo de gozações com muita constância, se retraia e se afastava de todos.  Finalmente aos dezoito anos decidiu por um fim a tudo aquilo e conseguiu na justiça a troca de nome. 
Foi a partir daí que observei como o nome influencia a pessoa. O Tranquilo que era a calmaria personificada, ao mudar para Luís Guilherme sofreu uma mudança incrível de comportamento.  Aquele sossego tão conhecido deu lugar à coragem e uma autoconfiança que nunca havia se manifestado antes e isso era motivo de muito orgulho para ele.  A timidez e apatia sumiram por encanto.
Conheci um novo aluno numa transferência recebida no meio do ano. Era extremamente envergonhado e retraído.  Como falava baixinho, pedi que se aproximasse para que eu pudesse anotar seus dados pessoais.
Ao perguntar-lhe o nome levei um choque.  A resposta dada numa voz insegura e quase inaudível foi: Sebostílio
Fiquei em dúvida e refiz a pergunta recebendo a mesma resposta.  Tive que fazer um esforço supremo para demonstrar naturalidade e não deixar escapar um mínimo de sorriso que fosse. Consegui. Apresentou-me a seguir uma certidão de nascimento.  
Foi aí que entendi tudo:
Pai: Sebastião
Mãe: Otília
Seu nome era uma homenagem aos pais.
Não tive mais notícias de Sebostílio. Até onde o acompanhei, ele continuou com esse nome e atendia pelo apelido carinhoso que os novos amigos lhe deram: Sebinho.  
Menos mal, pensei – pior seria se fosse Bostinha!
Nesse caso em especial fui obrigada a concluir que realmente gosto não se discute, lamenta-se!

Santos, 15 de novembro de 2011  

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