domingo, 15 de julho de 2012

UMA CERTA CADEIRA DE PRAIA




Em função de sua criatividade sui generis e extrema mania de organização que já foram comentadas em outros textos deste blog (O discípulo do Prof. Pardal, Meias de Outono e Livre ou Ocupado?), meu pai foi protagonista de muitas histórias hilárias e de outras tantas que provocaram reações de espanto na família.
Sua mesa de trabalho era arrumada com perfeição e cada objeto tinha posição exata para ficar sobre ela. Sendo assim, quem fizesse uso de algo tinha que ter o cuidado de repor exatamente no local de onde tirou sob a pena de levar uma bronca, caso isso não fosse respeitado.
Para garantir que sua arrumação fosse mantida por ocasião da limpeza da mesa, elaborou caprichosamente um croqui onde desenhou a disposição exata de cada objeto, croqui esse colado na parede sobre a mesa.  Assim, ao tirar-se o pó do tampo, bastava olhar o desenho para recolocar cada material na posição certa.
Outro costume comum era fazer anotações nos objetos para lhe facilitar o uso.  Não teve dúvidas em pintar com destaque os botões de ligar, desligar e alterar volume do recém-comprado aparelho de som.
Em meio a essas marcas feitas aqui e acolá pela casa toda, uma delas em especial, poderia ter lhe garantido o Prêmio Nobel da Guerra, caso tal prêmio existisse.
A televisão do quarto era de seu uso exclusivo já que sua predileção era por programas que a família não apreciava muito e a recíproca era verdadeira.  Como um problema nos olhos dificultava sua visão à distância, ele providenciou uma cadeira de praia que era colocada perto da TV.
Entretanto, a posição da cadeira que mais lhe agradava e facilitava a visão, ficava justamente próxima à porta de entrada do quarto, bem na passagem.  Sendo assim, ao desligar a TV, fechava e guardava a cadeira para não atrapalhar a circulação.
Acontecia porem que cada vez de usar a tal cadeira, ele demorava um pouco para acertar o local exato de colocá-la para ter uma boa visão da tela.
Foi aí que veio a “brilhante” ideia!
Seguindo seu instinto de fazer marcas em tudo, rapidamente lançou mão de um pincel atômico de cor preta e pôs-se a marcar com grandes círculos, os locais exatos no chão onde ficaria cada um dos quatro pés da cadeira. 
O piso do quarto era revestido de carpete bem claro e tinha pouco tempo de uso já que a casa era uma construção recente.
Resultado: quem entrasse no quarto já veria de imediato, quatro grandes círculos pretos pintados no carpete claro.
Ao concluir o trabalho e satisfeito com sua criatividade que solucionara o problema, ele saiu da casa assobiando como sempre, sem comentar com ninguém sua grande obra.
Quando a esposa entrou no quarto e deparou-se com aqueles quatro enormes círculos pretos no chão que ela mantinha sempre muito limpo, faltou pouco para ser decretada a terceira guerra mundial.
Extremamente irritada e indignada com o estrago no carpete, ela questionava sem parar pronunciando seu tradicional bordão - Não brota? Não brota? – querendo dizer com isso que não brotou um pensamento, um raciocínio lógico sequer, que indicasse que ele estava estragando o carpete.
Por dias seguidos ela tentou remover sem êxito as escuras manchas, conseguindo apenas clareá-las um pouco.
Finalmente se deu por vencida e acabou acostumando-se com a nova decoração do ambiente. 
Ele por sua vez ficou satisfeitíssimo.
Suas marcas estavam salvas e a cadeira continuaria a ser posicionada tranquilamente sempre no mesmo lugar.
A Terceira Guerra Mundial foi abortada a tempo!

Santos, 15 de julho de 2012  

10 comentários:

  1. DELICIA DE LEITURA.
    MENINA, VC TEM DOTES QUE EU NÃO IMAGINAVA!
    QUE MANEIRA GOSTOSA DE CONTAR HISTÓRIA.

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  2. Que bom que gostou Maria Eugênia.
    Escrever foi a maneira que encontrei para recordar essas histórias e expressar sentimentos.
    Obrigada pela visita.

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  3. Ligia querida,nesse meu momento de agradecimento ,quero dividir com meus amigos e deixar os meus
    Parabéns!
    Cy

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  4. Ligia, estou lendo seu conto e rindo dos artifícios de seu pai. Muito interessante mesmo. Vc escreve tão bem e sempre nos brinda com contos interessantes demais. Parabéns!

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    1. Pois é, o Sr. Italo foi protagonista de muitos causos divertidos, principalmente por causa de suas ideias nem sempre aceitas e compreendidas por minha mãe..kkkkk

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  5. Que leitura deliciosa, leve e agradável. Muito bom poder compartilhar com vc essa vivência. PARABÉNS e BJS.

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  6. É sempre muito bom ler os teus contos. Parabéns Liginha.

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  7. Parabens Ligia.....Voce para mim e uma gde escritora....Linguagem simples e clara descrevendo as peripercias do seu finado pai....Continue nos deliciando com seus contos...Bete Arnold

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  8. Liginha,amiga querida,como vc escreve maravilhosamente bem.Seus contos,todos sem exceção, são peculiares.Este,do Sr.Italo,seu pai, é muito divertido!!!!Parece que estou vendo,ele em suas exigências...Estou vendo tbm,sua mãe,qdo viu os círculos no carpete claro.....Lembro.me tão bem dela e de seu Pai.❤️❤️❤️ Parabéns amiga pelo divertido Conto👏👏👏👏👏

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  9. Obrigada por suas palavras e pela visita ao blog Maria Eliza! Realmente minha mãe ficou muito brava e quase deu divórcio....kkkkkkk

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