domingo, 19 de fevereiro de 2012

ERA UMA VEZ UM BATACLÃ



Graduação concluída e ela resolvera continuar seus estudos na área de Genética Animal que muito lhe agradava. Os momentos dedicados às pesquisas eram especiais e curtia muito “por a mão na massa” como dizia.
Enquanto os estudos teóricos eram feitos na Universidade em São Paulo, a parte prática era desenvolvida num pequeno laboratório localizando no então chamado Horto Florestal de sua cidade.
Passava horas numa sala fechada e com temperatura controlada, mexendo, remexendo e observando seu material de pesquisa - as pequenas drosófilas mais conhecidas como moscas das bananas. 
Vidros, algodão, equipamentos de esterilização, lupas e material para meio de cultura completavam o cenário daquela sala escurecida com papéis pretos nas janelas evitando-se assim a visita do Sol e sua interferência nos estudos ali desenvolvidos.
Com cronômetro em punho lá ficava ela analisando e anotando o tempo e estratégias de corte que o macho fazia à fêmea como também quantos minutos duravam os acasalamentos dos bichinhos. A cada semana novas linhagens eram obtidas e novos dados enriqueciam a pesquisa.
Em pouco tempo sua sala passou a ser chamada de Bataclã devido às semelhanças de atividades que ocorriam nela e na famosa casa noturna descrita por Jorge Amado em seu romance Gabriela, Cravo e Canela.  Pensando bem talvez faltasse uma certa luz vermelha para a semelhança ser maior.
As pequenas drosófilas passaram a fazer parte de seus dias, o mesmo ocorrendo com sua amiga desde os tempos de colégio que também optara por continuar seus estudos em Genética.
Diferente dela porém, sua companheira desenvolvia um trabalho de campo. Semanalmente se dirigia para o mato entre plantações de eucaliptos e pinheiros para coletar e depois analisar as diferentes espécies dessas mosquinhas encontradas na região, atraídas que eram para esses locais por iscas lá deixadas no dia anterior.
Certa feita a amiga necessitando fazer a tal coleta e receando entrar sozinha no mato, solicitou à companheira que fosse junto no que foi prontamente atendida. Lá foram ambas, vidros e puçá em mãos se enfiarem entre arbustos e árvores.
Preocupou-se em levar junto um grande facão para alguma eventualidade mas ao contrário da amiga, descuidou-se com algumas pequenas medidas de segurança como, por exemplo, calçar botas de cano alto. É bom lembrar que naquelas priscas eras, a moda ditava calças compridas com pernas bem largas.
Em meio à coleta enquanto a amiga entusiasmava-se com a quantidade de mosquinhas, ela sentiu a princípio o que seriam leves cócegas em sua perna direita logo abaixo do joelho.  Não deu muita atenção, mas a sensação de cócegas começou a subir até chegar à coxa.
De repente um arrepio gelado percorreu sua espinha de cima abaixo. 
Com certeza um animal havia entrado por dentro de suas calças e agora passeava tranquilamente sobre sua coxa direita. 
Apavorada deu um grito sem saber se deveria apertar ou não por cima da roupa mesmo, aquele animal que andava em seu corpo.
Se fosse um escorpião ou aranha o risco de levar uma picada seria ainda maior.
A amiga veio em seu auxílio pedindo que tirasse as calças rapidamente.
Como assim???   Abaixar as calças ali no mato??? 
Já era conhecida como a dona do Bataclã e agora isso, virar uma stripper a céu aberto??  
Lembrou que nas proximidades outros professores também costumavam fazer suas coletas. Enquanto olhava para ver se havia mais alguém por perto, sua amiga tomada pelo pânico arriou suas calças em segundos.
Foi com cara de abestada diante daquela cena insólita e inesperada que ela viu um saltitante gafanhoto sair todo lampeiro de dentro de sua roupa, sumindo mato adentro.
Respirou aliviada e por instantes até se esqueceu de sua situação no mínimo vexatória. Agradecendo a presteza da amiga vestiu novamente as calças e tratou de voltar rapidinho ao aconchego de sua sala.
Com certeza era bem mais seguro administrar seu Bataclã!

Santos, 19 de fevereiro de 2012  




Para Vera, amiga de tantos anos e companheira de muitas façanhas.

6 comentários:

  1. Lembrar destas cenas,me fez voltar a um passado muito especial e divertido,com muitas estórias.
    Como esse quantos outros passamos juntas.
    Parabéns,você tem mesmo o dom da escrita,revivi tudo com muita clareza.Bjs

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  2. Enquanto escrevia essa história lembrei-me do professor texano e nossa fuga estratégica pelo elevador, da blusa vestida pelo avesso no curso do Museu de Zoologia, das larvas de insetos esquecidas no ônibus da Viação Cidade, dos dias inteiros fazendo plantão na reitoria da UFSCAR, do lanche feito de madrugada na casa do delegado de polícia de Mogi, o trem da madrugada e outros tantos casos.
    Foi mesmo um período especial e muito divertido como vc disse.
    Obrigada por suas palavras Vera.
    Bjs

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  3. Liginha mais um conto rico e gostoso de se ler. So tenho uma pergunta que nao quer se calar: qual de vcs duas estava com o gafanhoto safado dentro da calca? Rsrsrs

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  4. Adivinha só Malu!!!
    Se vc pensou que era eu.....acertou...rrsssss
    Fiquei de vento a favor no meio da mata...eita!!
    A sorte é que não era animal peçonhento.
    Tempos depois uma mariposa fez a mesma coisa e eu na frente da classe dando aulas...que apuro. Mas essa é uma história que ficará para uma outra vez...rsss
    Obrigada por seus comentários.

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  5. Isso já aconteceu comigo, mas era uma barata. Por sorte estava no quintal de casa, mas o muro que dividia a casa do vizinho era baixo então fui assistida por poucas pessoas que correram para ver o que acontecia. Gostei muito de ler esse conto, lembrei-me da infancia. Eta que saudade.

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  6. Nossa! Embora eu não chegue a ter pânico de baratas, esse realmente é um bichinho que não suporto. Graças a Deus foi um gafanhoto, dos grandes, mas...gafanhoto e não barata..credo!..
    Obrigada pela visita Diva.

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